por Telma Braga
Essa é uma história com três porquinhos. Não é difícil descobrir, basta desvendar o enigma do título: Saga + tri +suíno + rana (sufixo de origem tupi que significa “à semelhança de”). É também um reconto à moda de Guimarães Rosa escrito por um outro João, por sinal também Guimarães, o João Luiz Guimarães.
Então, se você pensa que vai encontrar a história dos Três Porquinhos recontada de modo a lembrar a linguagem roseana, você quase acertou. Quase porque não é bem isso. Nonada. É muito mais que isso.
Mas se há Rosa, na prosa, há linguagem brincante, há montanhas das Gerais, há buritis e embaúbas. Há também um rio que já foi doce. E, sim, há porquinhos! Um quase rosa, um verde, um quase. Há lobo, há fuga, há medo. O medo do lobo. Dos lobos.
Enquanto seguimos pelo texto, descobrimos uma outra história possível nas belíssimas ilustrações de Nelson Cruz. Quando essas histórias se juntam, ganham o ritmo acelerado de uma correnteza que nos arrasta de uma vez até a última página, até a dor dos que são de Bento, dos que são de Mar e de Bruma.
Respiro. Preciso parar de escrever e me recompor. Exatamente como fiz ao terminar a leitura desse livro. Respirar e tentar entender como se pode tirar tanta beleza da dor.
Publicado pela Ozé Editora, Sagatrissuinorana é dedicado às vítimas da tragédia de Mariana, Bento Rodrigues e Brumadinho. Foi vencedor da 63ª edição do Prêmio Jabuti nas categorias melhor livro infantil e livro do ano e do Prêmio Ofélia Fontes (2021), de Melhor Livro para Criança, da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ). Tem ainda o selo Distinção Cátedra Unesco de Leitura – PUC Rio 2020 e figura entre os 30 melhores livros indicados pela Revista Crescer em 2021.
Ainda assim, você pode se perguntar se é um livro para crianças. Depende da sua criança, de você e das veredas pelas quais vocês atravessarão a história. E a vida. Refletir sobre quem é esse Tinhoso que nos espreita, dissimulado, de dentro do redemunho, enquanto passamos pela vida distraídos, nem sempre é fácil, mas necessário. Refletir sobre causas e consequências de uma dor, também é doído, mas pode ser o único caminho para que ela não se repita. Talvez por isso, o livro, que passa por um vermelho intenso na página da última dedicatória, retoma a cor verde do início. Afinal, viver pode ser perigoso, mas a vida “transtraz a esperança”. Sempre.
SAGATRISSUINORANA
Texto: João Luiz Guimarães
Ilustrações: Nelson Cruz
Projeto gráfico: Raquel Matsushita
Ozé Editora, 2020
Telma Braga é filha de Seu João, contador de causos, e de Dona Lydinha, contadora da vida.
Professora, contadora de histórias, escritora.
Pós-graduanda d’A Casa Tombada nos cursos O Livro para a infância e Narração artística.
Mestre em Língua e Literatura Francesa pela UFRJ.
Aluna especial no PPGCEN -UNB, aspirante ao Doutorado em Artes Cênicas.
Mas principalmente conversadora, escutadora de passarinhos e abraçadora de árvores.
Apaixonada por dar aulas, cantar, viajar, escrever, ler, brincar e tomar café com os amigos, nem sempre nessa ordem.
Já ministrei várias oficinas de poesia para crianças, jovens e professores.
Costumo dizer como Riobaldo: “quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa.”
Contato: @telmaalmeidabraga
Aquarela de Meire de Oliveira. (@aquarelistameire)