Sem chão, por Keiciane Valduga
Céu, sol, sul, terra e cor.
É o que diz a música.
Mas quando eu era criança, e algumas vezes ainda hoje, de alguma forma num equívoco musical eu entendia e repetia “céu, sol, sul, terra e chão”.
Hoje, o meu Rio Grande do Sul tem sido menos sol, o céu tem sido mais cinza, a terra tem sido mais água e, como na minha música da infância, tem de fato menos cor.
A cor é o marrom, da lama.
E, como na música original, é sem o chão que se está.
Depois que a água invadiu nosso estado, nosso espaço, só consigo pensar como pode a suposta representação da vida trazer tanta morte.
Não, aonde eu moro os efeitos não tem sido tão concretos nem tão diretos, estamos secos e seguros. A água não chegou até aqui, mas a desesperança sim. E é avassalador ver um povo, nosso povo, sem chão.
É ter chão que nos permite pisar pra impulsionar o sonhar. É o chão que dá lugar, ampara a vida. O nosso chão, a nossa terra, a nossa casa, as nossas coisas. Tem sido muito triste ver se perder o chão, os sonhos, as vidas.
Hoje faz sol por aqui, e imagino que em outras cidades também. Espero que por lá ele leve um pouco mais de cor pra quem tem ainda muito chão pela frente.
Keiciane Valduga.
Escute o poema na voz de Kellen Lima:
Pílulas Poéticas – para atravessar dias difíceis
Keiciane Valduga – Sem Chão
Voz: Kellen Lima
Música ao fundo – Hoy Como Ayer – Hermanos Guitiérrez
“Pílulas poéticas para atravessar dias difíceis”, criado por Kellen Lima é um projeto de envio de poemas para as vítimas das enchentes do Rio Grande do Sul. Se você quiser colaborar enviando poemas, áudios, imagens, vídeos poéticos, escreva para: blogdacasa@acasatombada.com.