onde o fio e o nó se entrelaçam

por Fernanda Asteracea

 

 

 

carta n º 1

percorrer os espaços vazios e palavras não continuadas.

 

 

carta nº 2

 

autorretrato I

estar aqui, quando o sol se esconde no fim do dia

tocar a linha que liga o silêncio a si

permanecer quando a inquietude abrir um buraco sobre                    –               a terra.

 

autorretrato II

olhar sobre os olhos

tocar a pele

deixar que a mancha fale por si

quando o silêncio invadir a casa, cantar um soneto de afeto.

 

autorretrato III

na ponta dos seus dedos

na ponta dos meus dedos, escondo palavras

poesia mansa que me recolhe durante os trovões no céu.

 

autorretrato IV

não estar aqui é permanecer.

 

autorretrato v

tenho evitado falar de mim

como quem faz o nó e não sabe desfazer

como o céu agora que permanece nublado

minha pele cheia de manchas

estas que se tornam

os mapas

para dizer que o som continua saindo

e que a voz permanece                                                                             –             ausente.

 

 

carta nº 3 

 

feridas rasgam o peito, deixando exposta a carne crua do ser.

 

carta n º 4

 

palavras pronunciam sons incertos

criando resquícios 

dor latente

talvez seja esse nó

os músculos se contraem

fragmentos

diferentes intensidades

de memórias vividas

o silêncio tem sido                      – som

a dor me cala

aquece

intacta 

em emoções latejantes

 

uma caixa 

vazia

silenciar-se

o corpo escolhe

ser escuta

quando tudo dilacera.

 

 

carta n º 5

 

mudar o percurso

a palavra

a intenção

 

saltar sem rede

cair sobre o chão

terra-seca

 

pôr os pés debaixo da terra

demora-se

no tempo

na pausa

 

no espaço

dançar o corpo

remexer-se

cair

 

afundar-se

na partida

que ecoa

na voz das distâncias

 

atravessar

pela linha

ser poeira

em dias de trovoada

 

quando a chuva cair sobre o solo

a terra sobe

em respiro

somente pela colisão

que tem com a água

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fernanda Asteracea, transita entre Cachoeira e Cruz das Almas, Bahia. É artista visual e ilustradora graduada no curso de bacharel em Artes Visuais pela UFRB. Seus trabalhos e pesquisa caminham junto ao seu projeto de carta-grafias de si: que investiga as relações entre corpo e imagens de si no processo criativo. Sua produção artística caminha entre palavras, desenhos e linhas; participa desde 2018 dos grupos de estudo História da Arte e Gênero, e Transcriar como também o grupo de pesquisa a Ahora ponemos el mapa al revés, ambos pela UFRB. Em 2018 lançou o livro-postal independente ‘à procura’. Em 2020 participou das publicações coletivas ‘invencionices gráficas: livro ilustrado’, ‘Ser uma boa ancestral: mulheres que escrevem’ e Fotolivro Digital Evoca; participou das exposições coletivas: 1º Salão Nacional de Artes Visuais Virgínia das Artigas, Mostra [2055] UFRB, Exposição virtual Desverdevires e Nós Mulheres Artistas. Foi premiada pela lei Aldir Blanc Bahia com o projeto mapa-inventário no qual foram publicados os livros digitais mapa-inventário e corpo-ferrugem pela andarilha edições. Instagram: @asteracea e-mail: fasteracea@gmail.com

Cursos d'A Casa

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[27/07/21] Poesia marginal e periférica – com Jéssica Balbino

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