Descrição
Rodoviárias, estações de trem, metrô, aeroportos... Esseslugares sempre exerceram em mim imenso fascínio. Até hoje o fazem. Em todos eles você é somente mais uma pessoa, a passar praticamente desapercebida por tantos fluxos e emoções dentre aqueles que atrasados, correm; desatentos, se demoram; saudosos, se despedem; esperançosos, partem animados com novos rumos; muitos trabalham para que quem está em trânsito possa se deslocar... e por aí vai. Uma infinidade de micro e macro cenas, verdadeiros palcos da vida, prato cheio para quem gosta de observar. Sempre fui assim. Em contextos macro, mais de observar e ouvir do que de falar. Meu pai até brincava dizendo que Deus nos deu dois olhos, dois ouvidos e uma boca só. Independentemente de ter sido Deus ou não, a mim faz sentido a analogia com as quantidades. Quando criança, havia uma pessoa doente em minha família. Onde quer que estivéssemos, nossas vidas eram sempre comentadas pelas pessoas. Muitas vezes por curiosidade, preocupação. Outras tantas por falta do que fazer ou até mesmo maldade. Um julgamento terrível. Aquilo me oprimia muito. Odiava ser destaque desses olhares todos naquele contexto. O que eu queria mesmo era ser invisível. Hoje, ainda gostaria muito de viver essa experiência da invisibilidade. Não mais pelos mesmos motivos. Com o tempo acabamos aprendendo a dimensionar a importância do que dizem os outros em relação ao que vivemos e sentimos nós. As coisas vão mudando de tamanho, de importância. Fato é que protagonizar sempre foi (e ainda é) um desafio sem tamanho para mim. E por protagonizar, não digo em algo grande como uma performance, uma peça de teatro. Não. Falo das cenas simples do cotidiano... Da (falta de) coragem de fazer uma pergunta em sala de aula, de dizer àquelas pessoas todas o quanto me incomodavam, ou dizer a um grupo de amigos que eu preferia ir ao parque do que ao shopping... Numa mistura de dores, conforme o tempo foi passando, pude ficar com as aprendizagens desse processo e descobrir as delícias dele também. Já dizia um grande amigo meu: “A dor é inevitável. O sofrimento é uma escolha.” Nas parcerias muito próximas, eu era mais falante. Ainda assim, me colocar quanto ao que queria ou não, seguia como um desafio. Nas demais cenas do cotidiano, fui me tornando uma pessoa cada vez mais silenciosa, observadora e com uma imensa e sincera capacidade de escuta. Da mesma maneira, fui encontrando caminhos que me deixassem confortável quando tinha vontade de falar ou perguntar alguma coisa.